ENTREVISTA CONCEDIDA POR ANDRÉ JORDAN, AO SUPLEMENTO GOLFE DO EXPRESSO

André JordanMenos de três meses depois de ter sido capa de um dos primeiros números da «Única», a nova revista do Expresso, devido a uma entrevista intitulada «O Visionário» que, naquele Sábado, fez o jornal esgotar no Algarve, André Jordan recebeu de novo o suplemento «Golfe» no seu escritório da PlanBelas, no centro de Lisboa, para a tradicional entrevista anual. Em 2003, fomos encontrar um André Jordan cordial, como de costume, mas sem medo de criar polémica em torno dos novos Estatutos da Federação Portuguesa de Golfe, um André Jordan de intervenção, a avisar o Governo e o Parlamento da necessidade de olhar com cuidado para a questão do ‘off shore’, e um André Jordan cauteloso na expansão que o negócio do golfe está a viver no Algarve sem o necessário acompanhamento de capacidade hoteleira. 

Disse-me que tinha uma novidade para dar-nos em primeira-mão e que era uma boa notícia para o golfe português? 

Na edição de Novembro da Golf World, foi publicado um ‘ranking’ de campos europeus e Portugal consegue colocar 13 campos nos 100 primeiros, 6 campos nos 50 primeiros, ou seja, tem 20% dos seus campos entre os melhores campos da Europa. Espanha tem 4% e França tem 2%. Em números absolutos, têm mais campos do que Portugal, mas o seu peso relativo é menor. Penso que isto prova que o esforço de qualidade e excelência que, não só o nosso Grupo, mas também outros, têm perseguido está a dar os melhores resultados, com o devido reconhecimento. 

E dentro desses campos nomeados pela Golf World tem campos seus? 

Tenho o Old Course, que é o nº50, e campos que fiz como San Lorenzo e Quinta do Lago. 

Talvez por isso o negócio de construção e gestão de campos de golfe continue a expandir-se no nosso país. 

Nós temos a mais baixa densidade de jogadores por campos de golfe da Europa. Incluindo os turistas, temos uma média de utilização por campo de 250 pessoas, que é, efectivamente, muito baixa. Penso que quem vem para investir neste sector, terá de ter muito cuidado se pensar apenas que isto é uma galinha dos ovos de ouro. Ainda por cima, há demasiados campos sem camas, ou seja, sem hotéis.  

Li um artigo do Fernando Nunes Pedro, em que ele referia que cada campo de golfe em Madrid abrange cerca de 3000 utilizadores. É uma diferença enorme em relação a Portugal. 

É, de facto, uma discrepância enorme, temos de ter, cada vez mais, cuidado com este problema e, seja em que local for no país, teremos de ligar cada vez mais os campos de golfe ao apoio hoteleiro. Só assim poderemos elevar o número de jogadores por campo. 

Disseram-me há pouco tempo que o último hotel de cinco estrelas construído no Algarve foi o da Quinta do Lago, já lá vai uma década. Não estará já o Algarve a necessitar de mais investimentos nesse sector? 

Absolutamente! Agora, vão surgir dois hotéis de cinco estrelas em Vilamoura, um do Grupo Amorim e outro do Grupo Espírito Santo. São, não apenas, hotéis de cinco estrelas, como hotéis do tipo ‘resort’, com um componente de imobiliário, integrados na nova geração de hotelaria. À excepção do Sheraton, os hotéis de cinco estrelas no Algarve eram hotéis urbanos adaptados a zonas de férias. Tinham umas piscinas, uns ‘courts’ de ténis e achavam que era suficiente, mas não eram projectados de raiz a pensar em ‘resorts’ de férias. A grande tendência é ligar o hotel de cinco estrelas em zonas não urbanas ao imobiliário, como forma de melhorar o financiamento da construção de hotéis. Infelizmente, a legislação portuguesa de turismo ainda não percebeu a importância deste relacionamento e ainda há entraves legislativos desactualizados e desnecessários. Mas há outros hotéis a surgir. Julgo que o hotel do Grupo TUI na Quinta da Ria será uma peça muito importante naquela zona 

Li também um artigo muito interessante do Luís Ledo no qual ele defendia que o turismo português ainda não compreendeu as enormes vantagens de apostar num mercado residencial de estrangeiros, que estejam reformados ou que desejem segundas residências, como forma de combater as crises cíclicas dos fluxos turísticos. Concorda com esta tese? 

Não só concordo, como tenho vindo a defender essa ideia em entrevistas e artigos há cerca de 30 anos. Infelizmente, estamos agora diante de um grave impasse que é, de acordo com o Orçamento de Estado para 2004, o que se prevê para as propriedades ‘off shore’. Independentemente da importância que possa ter o controlo desse tipo de actividade económica, o facto é que essa legislação paralisou por completo o mercado de segundas residências estrangeiras em Portugal. O Governo e o próprio Parlamento pensam rever todo este processo. Tenho dito várias vezes que a Espanha tem dois milhões de residentes estrangeiros e a França três milhões de proprietários estrangeiros, mas a grande maioria são propriedades em ‘off shore’. De acordo com o nosso território e a nossa população, se tivéssemos 500 mil estrangeiros com propriedades em Portugal e durante dez anos vendêssemos 50 mil unidades a estrangeiros, obteríamos uma receita, por exemplo, muito superior aos fundos estruturais da União Europeia e isso iria contribuir fortemente para resolver muitos dos problemas económicos do país. Por outro lado, esse é um meio de fixação dos turistas. Creio que, neste aspecto, houve uma descoordenação e uma falta de compreensão da realidade, porque, de acordo com a nova legislação, um proprietário pagaria qualquer coisa como 100 mil euros por ano de imposto. É óbvio que não vai pagar e o Governo português irá deparar-se com milhares de estrangeiros que não irão pagar, será obrigado a entrar em processos judiciais, o que, politicamente, é inviável. Portanto, estamos numa situação de impasse que é importante atacar e penso que o Governo está consciente disso.  

A FPG está a estabelecer protocolos com proprietários de campos comerciais, no sentido de se tornarem sócios da Federação. Está de acordo com essa medida? 

A FPG resolveu, magnanimamente, aceitar que as empresas proprietárias de campos de golfe se tornassem sócias da FPG, convidando-as a pagar uma taxa de acordo com o número de voltas por ano. Penso que aqui há um erro de interpretação. O que importa não é o que as empresas possam fazer pela FPG, mas sim o que a FPG pode fazer pelas empresas. Independentemente do valor económico dessa contribuição, o que isso demonstra é que a FPG entende que deve cobrar uma taxa, uma espécie de imposto às empresas, por terem jogadores. Penso que o sentido dessa proposta está completamente equivocado. Temos muito poucos golfistas em Portugal, a FPG ainda promove um elitismo através de uma dicotomia falsa entre clubes de golfe e empresas de golfe. Na realidade, só existem três campos de golfe em Portugal que são de clubes. Todos os outros 50 campos são de empresas. E os clubes com maior número de associados são os que estão sediados em campos comerciais, como são os exemplos da Quinta do Lago, do Estoril e de Vilamoura. Essa é que é a realidade do golfe em Portugal.  

Está de acordo com a medida tomada pela FPG de abrir o Open a candidaturas de entidades interessadas em organizá-lo e promovê-lo? 

Acho uma medida correcta. É um passo para que se comece a encarar o Open como uma actividade comercial extremamente importante e como uma forma de promoção do golfe internamente e externamente. Quando fazíamos o Open na Quinta do Lago, iniciávamos a sua promoção nove meses antes e, como resultado, chegámos a ter 15 mil pessoas a acompanhar o evento. Hoje em dia isso não acontece e, neste preciso momento em que estamos a conversar (Outubro) ainda nem se sabe onde vai ser o Open de 2004. Nos dias de hoje, o mínimo é haver, pelo menos, um ano para se fazer a promoção do Open. 

O actual secretário de Estado do Turismo trabalhou no seu Grupo. É, portanto, uma pessoa que conhece bem. Pedia-lhe que o definisse como pessoa e como profissional. 

As qualidades do Luís Correia da Silva são muito conhecidas. Diz-se que as pessoas são suspeitas quando falam dos seus amigos, mas eu sou insuspeito porque convidei-o para vir trabalhar no nosso Grupo sem conhecê-lo e apenas pelo trabalho que tinha feito como vice-presidente do ICEP. Disse-lhe que no dia em que deixasse o Governo, viesse trabalhar connosco e isso realizou-se. Ele esteve seis anos connosco e a ida dele para a Secretaria de Estado do Turismo foi uma perda enorme para nós. Ele é um homem de enormes qualidades, como pessoa e como profissional. Quem o conhece, não só é seu amigo, como o admira. Só tem um defeito: é um ‘workaholic’, mas esse defeito só o prejudica a si próprio e não aos outros (risos). É um maníaco do trabalho que não sossega enquanto a coisa não está feita. Acho que tem tido uma actuação revolucionária no sector. Nem sempre um empresário tem vocação para a política, mas no caso do Luís Correia da Silva conjugaram-se as duas coisas.  

Entrevistei o secretário de Estado do Turismo para a revista Golf Digest Portugal e ele sublinhou que era um homem do golfe, dizendo mesmo que não renegava o seu passado. É uma atitude curiosa e só encontro paralelo no passado com o actual Presidente da República, Jorge Sampaio, e com o ex-comissário europeu e antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, João de Deus Pinheiro. Há, normalmente, um certo pudor do poder político em declarar-se tão abertamente como adepto do golfe. Julga que esta realidade irá algum dia mudar? 

Considero que, justamente, os nomes que citou, do Presidente Jorge Sampaio, e do ex-comissário João de Deus Pinheiro, contribuíram fortemente para desmistificar a actividade do golfe como elitista. O João de Deus Pinheiro abriu o caminho e o Presidente Sampaio acabou de vez com o tabu. É um desporto como qualquer outro. Diria, no entanto, para sermos completamente objectivos, que a imagem do golfe em Portugal e o fraco número de praticantes portugueses estão ligados ao desenvolvimento económico. À medida que o país se for desenvolvendo, irá registar um crescimento de jogadores igual ao resto da Europa. 

Na entrevista que me concedeu em 2001, disse-me que os seus campos no Algarve tinham atingido cerca de 200 mil voltas. Desde então, com a consolidação da crise internacional, que afectou o sector do Turismo, como tem evoluído a situação? 

É um tema ligado à situação que falámos sobre o aparecimento de novos campos. Nós temos mantido o número de jogadores, mas estamos a sentir dificuldades no crescimento. Nos principais mercados emissores, como Inglaterra, Alemanha e Escandinávia, o golfe não tem tido crescimento. Por outro lado, em toda a Europa, à excepção da Suécia, não tem havido um aumento significativo do número de campos. Só na Suécia e Portugal é que estão a construir-se muitos campos de golfe. No que diz respeito ao Algarve, em particular, o surgimento de novos campos, sem camas, está a “roubar” jogadores aos campos que já existiam. Apesar de tudo isso, estamos a manter o nosso volume de negócio e o nosso campo mais caro, o Old Course, continua a ser aquele que consegue mais receita e é o único que regista taxas de crescimento. Isso demonstra que a elevada qualidade é a que melhor se vende. Na Primavera do próximo ano vamos abrir o Victoria e será um campo tão extraordinário e tão único no seu estilo, que penso que as pessoas virão a Portugal só para jogar nele. É um ‘links’ atenuado, é uma adaptação de um ‘links’ europeu a um campo americano, uma combinação que acredito não existir ainda. Será um campo muito original, o que é muito difícil em golfe.  

Já tem alguma data fixa para a sua inauguração e há alguma festa, alguma celebração que possa anunciar desde já? 

Vamos fazer um ‘soft Open’ na Primavera, estamos em conversações com o Arnold Palmer para fazermos um evento especial no dia 10 de Setembro de 2004, para a inauguração oficial, porque é o dia em que tanto ele como eu celebramos os nossos aniversários. Não será um grande evento no sentido desportivo, mas será mais uma oportunidade de confraternização internacional, com os amigos dele, os meus amigos, os amigos de Vilamoura e, eventualmente, ligado ainda ao Prémio Infante D. Henrique, para ter também uma dimensão de solidariedade social. Temos planeado um grande evento mundial para Novembro de 2005. Estamos em negociações para trazer a Portugal um dos maiores eventos mundiais, com uma gigantesca cobertura televisiva, mas ainda não posso revelar mais nada. 

Dizem-me que o Victoria será o único campo em Portugal, ou talvez a par com o de San Lorenzo, com capacidade de rivalizar em prestígio com as grandes Mecas do golfe internacional. Ele foi pensado para ser, de facto, um campo singular no nosso país? 

Nós temos uma trajectória no golfe que passou pela construção da Quinta do Lago, campo que se tornou num clássico. Nunca me esqueço do que disse o Colin Montgomerie quando veio cá jogar em 2001, regressando ao local da sua primeira vitória, tendo afirmado que «todos os campos deveriam ser como este». Passámos também pela construção de San Lorenzo que, no actual ‘ranking’, é o nono campo da Europa, já foi segundo durante muitos anos e só não tem uma classificação mais elevada porque a manutenção não está ao nível que deveria e porque nunca teve um evento, o que também conta na elaboração do ‘ranking’. Pela longa experiência no sector, embora não me considere um ‘expert’, tenho confiança em dizer que o Palmer, que nunca fez um campo na Europa continental, e a sua equipa encontrou um terreno fértil que poderá corresponder ao melhor que a sua imaginação possa produzir. Uma das coisas mais espantosas que vejo em relação ao Victoria é que até para mim e para os meus colegas, aquele terreno que está ali hoje parece que sempre lá esteve. O trabalho de escultura, de modelação de terreno foi de tal maneira bem concebido e bem executado que, mesmo sem o campo já estar pronto, parece uma coisa natural. Da mesma maneira que a inauguração do campo da Quinta do Lago, em 1974, marcou uma nova era na concepção e construção de campos de golfe na Europa, como disse naquela altura Ben Wright, no Financial Times, estou certo de que, 30 anos depois, o Victoria terá o mesmo papel de abrir um novo capítulo na concepção e qualidade dos campos da Europa. 

A contratação da empresa do Palmer para construir em Vilamoura foi a primeira tentativa em Portugal de aliar a arquitectura de um campo a um nome famoso do jogo. Desde então, o Governo Regional da Madeira optou pelo mesmo sistema, ao encomendar os campos do Porto Santo ao Seve Ballesteros. Há alguma vantagem em solicitar serviços deste tipo a grandes jogadores, mesmo sabendo que os seus honorários são mais elevados? 

A sua pergunta é muito pertinente porque, ao longo de 30 anos a acompanhar a construção de campos, sempre fui descrente da necessidade de recorrer a grandes nomes de jogadores convertidos em arquitectos. Quando decidimos enveredar pelo quinto campo, pensámos e discutimos longamente sobre quem deveria projectar o campo. Chegámos à conclusão que no Palmer reuníamos dois factores: a capacidade de criar um campo único e um nome que fechasse com chave de ouro o conjunto de Vilamoura. Eu tinha a preocupação de que o quinto campo não fosse um complemento, mas um campo que, sendo o último, viesse, efectivamente, a ser o primeiro, a jóia da coroa. Nesse sentido, penso que acertámos em cheio.

Para a captação de jogadores, acredita na importância do nome do arquitecto? 

A informação estatística que temos dos campos do Palmer, e são mais de cem, espalhados pelo Mundo fora, é que têm entre 30% a 40% de receita superior aos outros que os circundam, pela qualidade e pelo nome.  

 

Entrevista conduzida por, Hugo Ribeiro 

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Revised: 18-11-2003 .