Então, boas tacadas XXXVII
 

O "busílis" da crise 

Nesta época de crise, falar de golfe é bastante difícil. Sobretudo para os golfistas que têm de pagar as quotas dos clubes ou as subscrições anuais, as bolas e o equipamento. A subida da inflação deve estar para chegar embora o preço das matérias-primas, no momento em que se escreve esta crónica, estejam a descer.  

Há contudo cronistas do nosso tempo que não se eximem em desconstruir o nosso mundo sem sequer o conhecerem. É o caso do Nobel português José Saramago que numa das suas recentes entrevistas afirmou que “ os culpados deslocam-se em limusinas e depois vão jogar golfe” e “ deve ser muito fácil apanhá-los”. Portanto, caro leitor, tenha cuidado. Se vir alguém com ar suspeito a aproximar-se dos lugares onde joga golfe, veja se não é um dos culpados da crise porque pode ser “apanhado” por um dos apaniguados deste famoso delator. É ainda o caso do escritor e comentador Miguel Sousa Tavares, que tem uma cruzada contra o golfe. Diz ele “ que os portugueses têm como destino servir os reformados ingleses e serem seus caddies”. Claro que ele não sabe que já não há praticamente “caddies” em Portugal. Prestar um serviço de “caddy” é bastante mais complexo do que ele pode imaginar. E, os portugueses, em geral, não sabem servir. E os ingleses são capazes de deixar de vir.  

Nestas catilinárias, estes cíceros modernos pretendem que o golfe é “ o pai de todos os males” . Seja por razões ideológicas, nuns casos, ou de”sustentabilidade ambiental” e protecção da natureza, noutros, o que é certo é que são eficientes. São tentativas de marcação de espaços apodando-os de elitistas. São como os felinos que vão marcando de urina o seu campo de acção. No caso do golfe e do turismo residencial são as demarcações de terrenos para a Rede Natura 2000 que totalizam 23% do território nacional. Qualquer coisa como 1, 9 milhões de hectares deste nosso lindo “jardim à beira mar plantado”. 

É óbvio que a crise que assola o mundo, cada dia mais pequeno fruto da globalização ou “mundialização” como os franceses preferem, está a pôr em causa alguns dos sectores mais importantes da vida económica dos países. Ter casa ou ter uma segunda casa num país de clima mais ameno – o denominado turismo residencial – vai ser mais difícil. Viajar, vai ser porventura mais complicado se o custo da energia aumentar ( hoje ainda não está) como se previa há algumas semanas atrás. O consumo de quase tudo vai baixar dramaticamente. Automóveis, têxteis, restauração. O crédito ao consumo vai também diminuir e custar mais caro. De uma forma geral a actividade económica vai diminuir perigosamente mergulhando milhões de pessoas no desemprego. A China vai deixar de produzir tantos bens baratos e vai ser obrigada a criar um “mercado interno” para escoar os seus produtos. Mas para tal,  terá que pagar mais aos seus assalariados. Quase o mesmo que Henry Ford fez nos anos trinta com o seu Modelo T: “ emprestar dinheiro aos seus empregados para que pudessem comprar os carros que produziam.”. Talvez assim fique mais fácil e menos perigoso, construir uma nova Humanidade baseada nos valores da igualdade e respeito pelo próximo.  Os países emergentes democratizam-se, melhoram o nível de vida dos seus povos à custa de uma sociedade ocidental demasiado consumista.  

E depois? Como é que isto acaba? Será que o mundo da comunicação com televisão e Internet veio destruir o interesse no futuro? Se temos acesso a tudo, se sabemos ao momento o que está a acontecer em Calomboloca, não fica nada para a imaginação! As ideologias desaparecem. As religiões perdem os seus crentes. Quanto mais conhecimento, mais individualismo, menos apetência para baias. Talvez o “cerne” da questão esteja no “bozão” de Higgs e na “partícula de Deus”. E um “admirável mundo novo” se apresente ao futuro do Homem. Como está, parece sempre mais do mesmo. 

Mas o mundo pode ressurgir numa nova “hiperdemocracia” com um “governo mundial” como diz Attali no seu recente “ Une brève histoire de l’avenir”. É o mais provável e o mais sensato. 

Nesse caso, a vida vai continuar num ritmo especial, a um nível superior de segurança, mas com outro fenómeno importante que tem a ver com o “nomadismo ambiental”. Vão acontecer grandes movimentos de gentes procurando climas mais amenos. Imagine-se o que será viver permanentemente com 40ºC e 100% de humidade, com monções, tufões, tsunamis. Na  China, na Sibéria, na Índia, em muitas partes do Brasil ou na América. 

Não é difícil ser-se optimista em Portugal. Por isso não se tem dado importância entre nós a esta crise do “subprime”. É que estão 25ºC lá fora,  um Sol luminoso e quando chover até vai ser agradável. Não vai fazer muito frio, nem muito calor. Não temos poluição, porque nem temos indústrias. Só a da celulose é que não deveria estar cá porque empesta o nosso ar. Mas a brisa atlântica refresca o ar no verão e aquece-o no Inverno. Do ponto de vista da amenidade estamos perto do paraíso. E, em princípio, vai ser assim nos próximos séculos, se não for mais. 

Portanto o que os cíceros têm andado a fazer nestas suas constantes e contumazes arremetidas contra o golfe, não é mais do que o negócio do futuro: vender a peso de ouro os terrenos da Rede Natura. Fazer da Costa Vicentina o Sillicon Valley de Portugal, doando alguns desse terrenos a Yale, Harvard, Cambridge, ou outras universidades do mesmo nível, com a criação de vários pólos de pesquisa científica, indústrias de ponta e lugares aprazíveis para viver. Pouca gente, turismo residencial de nível universitário, muito investimento, TGV de “magneto-levitation” até Helsínquia, e, talvez não me importe de ser “caddy” nas horas vagas da minha vida de consultor, tal qual o vendedor de seguros que foi a meu “caddy” da última vez que joguei em Pinehurst.

Então, boas tacadas

fnp-golfe@netcabo.pt

21 de Outubro de 2008

 

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Revised: 21-10-2008 .