Revista de Imprensa

 

Então Boas Tacadas XII - Cuidado, elas “andem” por aí!!! FORE!!!

Por, Fernando Nunes Pedro

 

Fernando Nunes PedroA primeira vez que tive um contacto de primeiro grau com uma bola de golfe foi na Carregueira, quando jogava o buraco 1, um par três, por cima do qual são jogados os drives do buraco 5, um longo par 5 que exige distância para se chegar ao fairway. Não ouvi qualquer espécie de “FORE” nem ruído que se assemelhasse, do tipo:

“Ouça lá, saia do caminho da minha bola”.

O barulho que ouvi foi mais sentido que ouvido. Foi na zona lombar do lado esquerdo e um frémito de raiva e de dor mal contida saiu da minha boca:

“ Acertaram-me!!! fui alvejado”

Em primeiro lugar agradeci a St. Andrews, o padroeiro do golfe, não ter sido atingido na cabeça. Aliás sou um homem de sorte; tive três guerras na minha vida – quando éramos colonialistas – e safei-me em todas. Depois, agradeci à minha avozinha que me deu alimento suficiente durante a minha infância e que me criou este “pneu” que me foi muito útil nessa situação.

O agressor passa por mim em passo acelerado, com o drive na mão e ainda me pergunta:

“Não viu aqui uma bola?”

Já imaginaram o que lhe respondi! Um conjunto de imprecações ditas de forma extremamente educada e especialmente rebuscada, diria mesmo, erudita do ponto de vista terminológico.

“Então, não viu onde me acertou? Levei uma porrada aqui, olhe, aqui”

O pobre homem nem olhou. As pernas tremiam-me de uma qualquer reacção à pancada, que não era de dor, mas algo mais de raiva, acrescida pela sua falta de interesse. Viu a sua bola a poucos metros do lugar onde nos encontrávamos, dirigiu-se a ela, e para meu espanto, – ele era canhoto – fez um swing de ensaio e depois:

“Vrooooom”!!!

Mais uma pancada com slice em direcção à montanha do lado esquerdo do fairway. Aconteceu o imprevisível que contraria a regra de que o melhor lugar para nos safarmos de um obus é na cratera do anterior. Desta feita só ouvi um grito de dor. O seu parceiro que obviamente não tinha nada a ver com aquele meu acidente e porque ele, lá de longe onde estava, não me vislumbrava caído no chão, gemendo de dores- não esquecer o “pneu”- avançara destemidamente pelo fairway e recebera uma pancada na canela da perna esquerda.

“Aaaiiiii!!!” Foi o grito que se ouviu.

O agressor, coitado, teve sorte duas vezes. Primeiro porque a sua bola não foi para a regueira porque o meu corpo fez de cortina; depois porque a canela do seu parceiro impediu que a bola fosse para o mato. Devia ter entrado para o Guiness porque não sei de alguém, que alguma vez tivesse acertado, com a mesma bola de golfe, em duas pessoas sucessivas - um adversário e um parceiro. Mas o mais curioso é que o feliz jogador causador destas pequenas desgraças, jogou a terceira para o fairway, a quarta para o green e um putt para um excelente 5. Contrato cumprido! A sorte de uns pode ser o azar de outros.  

Noutra situação, o Eduardo, um amigo, bom companheiro, excelente jogador e parceiro habitual nas minhas “quadradas”, um dia, levou com uma bola no calcanhar e não teve outro remédio senão atirar-se para o chão torcendo-se com dores. O causador do acidente acorreu prontamente, chegou ofegante perto do meu amigo e disse-lhe:

“ Peço mil desculpas, nunca pensei vir para aqui com a minha bola! Posso ajudar em alguma coisa?”

O meu amigo continuava sentado no chão com o sapato descalçado, vira-se para o autor da proeza e resmunga:

 “Ouça lá! qual ajuda qual carapuça! Só se você fosse ortopedista!”

“É exactamente por isso que estou aqui! É a minha especialidade.”

Não lhe mostrou o cartão de visita dobrado na ponta porque, francamente, a jogar golfe não se fazem assim tantos negócios quanto se apregoa – e não dá jeito. Aquela conversa entre os dois – o Eduardo e o João – continuou-se por muito tempo e agora são grandes amigos o que só vem dar crédito à vox populi:

“ Para grandes males... grandes doutores”, “ no timing correcto” juntaria eu. 

Há muitos anos atrás, numa das minhas primeiras investidas no golfe, aconteceu-me esta cena. O campo onde jogava em Luanda era cruzado por vários caminhos por onde passavam carros e pessoas. De pessoas não vou falar porque as situações eram muito perigosas além de que a “ guerra” em que se vivia não aconselhava drives dispersos especialmente porque o endereço do golfe era elegantíssimo:

 “Clube de Golfe de Luanda – Muceque do Golfe”, de modo que todo o cuidado era pouco. Um dos meus parceiros tinha um dos maiores slices que alguma vez tive oportunidade de apreciar. Eram realmente gigantescos. Depois dos três primeiros buracos, nos quais perdeu 8 bolas no mato profundo, resolvi, com os meus conhecimentos de 5 meses de iniciado e dando sequência à minha forte tendência para o ensino, dar-lhe alguns conselhos apropriados:

“Grip mais forte, apontar para a direita, o golfe é o jogo dos contrários (esta um pouco mais filosófica, outra das minhas pechas) “

O que é certo é que o meu amigo António tomou à letra o que lhe disse e, no segundo shot do buraco quatro, um longo par 4 que antes do green tinha uma estrada, fez o stance, dois waggles, e mandou o mais espectacular hook que alguma vez verei. A bola partiu célere como uma bala para a direita, inflectiu sobre a esquerda subitamente, bate duas vezes no chão antes da estrada e acerta em cheio no farolim dianteiro direito (!) de um taxi. Seguiu-se a habitual travagem de que me apercebi porque o vento estava contra. O António, especialista em slices olhava para a direita ainda no finish, todo torto e pergunta?

“ Onde é que está?” (deve ser a frase mais ouvida no mundo inteiro, só batida depois da inovação tecnológica dos telemóveis onde se junta um pequeno “s” ao verbo “estar” na segunda pessoa do singular),

“ Olha, António, não digas nada e vamos direitinhos para o green. Mas acho que partiste o farolim daquele taxi.”

Quando atravessávamos a estrada ainda ouvimos o taxista dizer com ar desalentado:

“Estas estradas estão cada vez piores. Então não é que a pedra saltou da estrada e veio partir-me o farolim?” 

Anos mais tarde, quarta-feira ao fim da tarde – no tempo em que conseguia jogar golfe ao meio da semana (aliás, não consigo perceber como é que com o tempo trabalho mais apesar da I&D) – jogava eu o penúltimo buraco, um par 3, quando gritávamos para o pessoal da manutenção que cortava os greens.

“Eiiiii! Vamos jogaaaar! “

Lá jogámos e quando chegou a minha vez, como sempre, fiz o meu draw normal, que com o vento se transformou num hook fazendo “aterrar” a bola em cima da cabeça de um dos trabalhadores do campo que, por sorte dele e minha também, usava um chapéu grosso com abas. O homem caiu no chão depois de um rodopio sobre si próprio e com ele caiu o meu coração.

“Pronto, mas porque é que jogaste? És um perfeito idiota”

Lá corri pela encosta abaixo até que, chegando ao green, o vejo a afastar-se em direcção à Casa de Manutenção. Perguntei aos outros colegas se ele estava bem:

“Não se preocupe, ele tem cabeça dura”,” foi só o susto.”

Preocupado nem acabei o buraco, pedi desculpa aos meus companheiros e dirigi-me ao lugar onde o Sr. Joaquim mudava de roupa.

“Oh! Sr. Joaquim, eu quero pedir-lhe imensa desculpa. Eu não devia ter jogado. Foi uma estupidez!”

O Sr. Joaquim levantou o rosto já sem chapéu, olhou para mim e de repente vejo os seus olhos, um a apontar para cada lado, prova irrefutável, naquele momento, da pancada que tinha levado na cabeça e do qual era eu o único culpado:

            “ Oh Sr. Joaquim, o que é que eu fiz? Você sente-se bem? Vamos já ao hospital”

“ Oh Sr. Fernando”, disse-me ele numa voz muito tranquila, “não se preocupe, eu sou mesmo assim! Sou estrábico desde nascença”. 

O tema desta crónica é muito mais grave do que o seu tom pode induzir. As situações sucedem-se a cada momento. Neste exacto segundo provavelmente haverá mais de 10 mil bolas de golfe pelos ares em todo o mundo... é só fazer as contas e sem exagero. Elas “andem” por aí...      

Então, boas tacadas

Fernando Nunes Pedro
fnp-golfe@netcabo.pt

21 Março 2005

 


Opções de Retorno
- Revista de Imprensa - Menu - Indice Geral


Portugalgolf
Tel: 309 906 452 Fax: 309 906 452
E-Mail : portugalgolf@netcabo.pt
Copyright © 1996/2008. All rights reserved

Revised: 19-06-2014 .