Revista de Imprensa
Então Boas Tacadas XXXIII - Uma manhã singular |
Por, Fernando Nunes Pedro |
Eu julgava que já tinha tido todas as experiências possíveis em golfe. Que já tinha ouvido todas as anedotas, visto que as novas apenas têm protagonistas mais actuais. Que já tinha observado o carácter das pessoas, a sua perseverança, a teimosia, a inteligência, a perversidade, a desistência, o orgulho, a petulância, a sagacidade, a destreza física, a coragem, a cobardia, o equilíbrio mental e a falta dele, a batotice em todas as suas formas, enfim quase tudo o que todos vemos quando jogamos com os nosso fellow-competitors, sempre na presunção de que não somos observados. Pois bem, desta vez foi qualquer coisa de diferente. Joguei com uma das minhas netas, a Bé, uma bela rapariga de olhos grandes e sonhadores, denotando a timidez própria dos seus 12 anos mas onde se vislumbra a luminosidade de uma vontade tenaz de vencer e de fazer bem e uma envergadura física excepcional para a sua idade com 1,73m de altura. No dia anterior encontrei-me por acaso com ela no Jamor. Fui lá para afinar o jogo. Uma impossibilidade, “mais noblesse...”. Mas vi que havia qualquer coisa no ar. A Bé também tinha ido treinar. Dei-lhe alguns conselhos, aqueles que se calhar não deveríamos dar, mas que se julga sempre que vão ser aproveitados. São sempre! Despedimo-nos desejando uma noite descansada. No dia seguinte encontrámo-nos no clube – o Lisbon, o vetusto e sedutor clube de golfe da Serra da Carregueira - para o pequeno almoço e o aquecimento, antes de irmos para o tee de saída. Tudo muito calmo, uma manhã de passarinhos que os meus ouvidos treinados iam apreciando, sem vento, temperatura amena, enfim, uma manhã ideal para um velho e sua neta entrarem numa das mais antigas competições do clube. Jogava-se em “four ball better-ball” e, portanto, a minha responsabilidade era enorme. A Bé tem um handicap de 28,6, um excelente , longo e elegante swing, aqui entre nós que ninguém nos ouve tem um drive mais comprido que o meu, ( shiuuu), mas quem tinha que jogar era eu. O primeiro buraco – prometo que não me alongo – foi normal: bogey feito pela Bé, o que deu 3 pontos. No segundo, tive uma saída normal e a Bé atirou uma pedrada para o meio da mata. Bola perdida. “Joga outra, tens duas pancadas e ainda marcas. Tens que ajudar o Avô”. A segunda foi “a capar formigas”, não levantou nem um centímetro. “Continua Bé, vais treinando porque o Avô ainda vai fazer par. “ “Oh, Avô, eu não consigo jogar!!!” – e as lágrimas saltavam-lhe dos olhos lindíssimos naquela manhã maravilhosa, ao mesmo tempo que ouvia a água a correr no riacho que quase transbordava das últimas chuvadas de Abril. (Não sei por que ouço sempre estas coisas). Fiquei sem saber o que dizer, até perceber que a Bé julgava que a bola dela é que contava. Não!? Afinal ela sabia. O que ela queria era levantar a bola. Vocês sabem ao que me refiro. Levantar a bola. “Oh, Avô eu não consigo, Tenho os braços muito duros. Muito duros, Avô”. “Mas o que é isso de braços duros?” perguntava eu, manifestamente incapaz de entender como é que uma jovem podia ter os braços duros. Ainda no mesmo buraco, depois de lhe dizer que “tens que olhar para a bola”, a Bé deu uma pancada espectacular. E com aquela bola ressurgiu o seu jogo e os bons swings, e as bolas no ar, e dois ou três pares, que ajudaram bastante na nossa classificação a meio da tabela. Mas daí até ao fim a Bé ainda chorou copiosamente, por mais quatro vezes, com lágrimas que ainda encheram mais a regueira, e a tornaram ainda mais bela, e com o seu Avô entre a felicidade da companhia, o orgulho babado, a responsabilidade do conselho atempado ou inútil, entre um olhar crítico e uma boa palavra, o quase zangado que tive que me mostrar, o pressentimento que algo de grave poderia acontecer como por exemplo a sua desistência, os meus olhos cansados por vezes húmidos de sofrimento e de alegria, outras vezes, numa cavalgada de emoções que nunca imaginei iria ter quando saí de casa naquela bela manhã de domingo. Tudo acabou com um grande beijinho e a promessa mútua de que, no próximo ano , lá estaremos para defender o nosso título de “ a melhor e, mais animada e lacrimosa parelha do mundo”. Prometendo que na próxima crónica retomo temas ...menos importantes, Então, boas tacadas.
Fernando Nunes Pedro 12 de Maio de 2008 |
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