Revista de Imprensa

 

Então Boas Tacadas - Para a Juventude uma mensagem de esperança

Por, Fernando Nunes Pedro

 

Fernando Nunes PedroTenho o tido privilégio de observar, semana a semana, há já vários anos, o enorme sucesso que é o golfe no Algarve. É um “mini-cluster” dentro do cluster do turismo, também ele de sucesso. São mais de 350 mil os jogadores de dezenas de países de todos os continentes que aqui deixam centenas de milhões de Euros e dão emprego a milhares de portugueses. 

O que têm eles todos em comum, para além deste vício que a todos nos une na procura da pancada perfeita, de uns “cobres” ganhos aos amigos, de inolvidáveis convívios gastronómicos e da discussão sobre qual o destino da próxima viagem? Os jogadores a que me refiro são em mais de  94%, jogadores estrangeiros. O que têm em comum? Nada mais simples do que boa forma física. Entrevê-se na forma como andam- sejam eles de que idade forem, velhos, novos, gordos, magros, barrigudos de muitas pipas de cerveja, de ambos os sexos - que há uma forma de se movimentarem á volta dos clubhouses e nos “swings” de aquecimento, que se trata de  pessoas que fizeram sempre muito exercício físico. 

Em muitas das conversas que fui estabelecendo com centenas desses visitantes, há sempre uma história de envolvimento desportivo: cricket, futebol, ginástica, natação, atletismo, ragueby, ténis, basquetebol, etc. Desde muito jovens, em todos os países, há desporto na escola, há competição entre os alunos,  há competição entre as instituições escolares a todos os níveis etários, desde a pre-primária até à universidade. Não conheço nenhum país europeu em que não seja assim. 

O golfe é, o mais das vezes, o último desporto da escala de experimentações. Depois do ténis, os médicos aconselham o golfe para destressar. A meu ver erradamente. Todos os anos milhares de jogadores morrem – santamente diga-se de passagem- nos campos de golfe, normalmente depois de noitadas de muitos copos e pouco descanso, a que se segue a ânsia de descobrir um novo campo ou, mais prosaicamente, com  medo de falhar. Mas, como dizia, o golfe aí está, em último lugar da lista, depois de se ter jogado com o mais diverso tipo de bolas e de todos os tamanhos.  

Descontando o caso dos Estados Unidos,- onde cerca de 2 milhões de jovens se iniciam no golfe cada ano e onde 1,9 milhões se desinteressam- e da Grã-Bretanha e do Japão onde se joga desde muito jovem porque o golfe é um desporto de família, há outros países que, sem terem condições climáticas especiais para a prática do golfe, tais como os escandinavos, produzem regularmente catadupas de jogadores a níveis exponenciais. É o caso da Suécia com mais de 600 mil jogadores federados e mais 200 mil que têm contacto com o golfe. Ou aqui a nossa vizinha Espanha, que já tem mais de 260 mil jogadores e que cresceu em 2002 a um nível de cerca de 3 mil jogadores por mês! Sim, Por mês! Claro que Espanha teve os Jogos Olímpicos de Barcelona em 92, o que a obrigou a fazer um esforço organizado seis anos antes para produzir campeões e medalhas para satisfazer o orgulho nacional. 

Utilizei dois termos no parágrafo anterior que resumem o problema do golfe português: organização e orgulho. 

A falta de jogadores de golfe em Portugal, não é um problema económico, e muito menos se deve ao facto de se classificar  o golfe como actividade elitista. Tão pouco é um problema de catarse política que nos chegaria por via do processo de democratização. E, por muito que alguns dos meus leitores possam adivinhar de menos coerência da minha parte, também não é um problema federativo, do seu proverbial amadorismo e da incapacidade de atingir metas. Não, nada disso. Não há golfistas portugueses, porque não há desporto em Portugal. Não existe uma cultura desportiva organizada, que aproveite as excepcionais condições climatéricas e que ponha a juventude a jogar com todos os tipos de bolas, a correr todo o tipo de corridas. 

Os bons exemplos vêm de alguns clubes, como por exemplo o Estoril Praia, onde treinam futebol mais de 450 garotos, dos 7 aos 16 anos, com professores atentos, uma organização que se adivinha nos equipamentos irrepreensíveis, no comportamento  dos intervenientes- têm um Código de Conduta que é exemplar. Todos os sábados há torneios com escolas de futebol de outros clubes, nos quais o mais importante é participar. Vencer e perder fazem parte do processo. 

Tenho pena que nas escolas, nos liceus e universidades de Portugal não se faça o mesmo que no Estoril Praia. 

Tenho pena que em Portugal se não faça como no Rio de Janeiro, onde se fechavam as ruas de Copacabana aos fins de semana, junto aos morros, se marcavam a giz, no asfalto,  campos de voleibol e que deram ao Brasil, em apenas vinte anos, vários títulos de campeões do mundo da modalidade. 

Tenho pena que a juventude portuguesa por falta de organização, passe o seu tempo agarrada ao computador e a ver televisão,  sem gastar um pingo de energia, transformando-se na juventude mais obesa da Europa. Mais de 50% segundo as últimas estatísticas. 

Cabe ao Estado e a todas as instituições que superintendem a educação e as actividades desportivas em Portugal um trabalho  - ciclópico, porque não – de inverter rapidamente a tendência de, também no desporto, ficarmos na cauda da Europa. Para começarmos a ter um pouco mais de orgulho em ser portugueses e ouvirmos cantar a Portuguesa mais vezes nos podiuns por esse mundo fora. O golfe, como modalidade última - o jogo que se pode praticar depois- , precisa desses desportistas. Eles vêm cá parar. Os campeões aparecem a seguir. 

Com muitas e boas tacadas 

Fernando Nunes Pedro
fnp-golfe@netcabo.pt

3 Novembro 2003

 


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