Revista de Imprensa
Aprender com o campo de golfe |
Este artigo foi publicado em "The Strategist", uma publicação periódica da DPI - Decision Processes International, tendo sido traduzido e adaptado pelo economista René Cordeiro, partner em Portugal da DPI e que é um praticante entusiasta do golfe |
Aprender com o Campo de Golf: O que é que Sistemas de Pensamento... ensinam acerca do Golfe e da Gestão por David K. Hurst
Como
Tom Watson, um profissional de golfe, observou uma vez, “Em minha opinião, um
excelente golfista ilustra dois aspectos muito nítidos. Um, constituído por próprios
fundamentos do jogo. O outro tem a ver com um movimento livre, solto. Sem o
primeiro, o segundo não se verifica”. É
por isto que acredito que o processo seguido por um golfista para jogar e
melhorar o seu jogo é
sistematicamente idêntico ao de um
gestor para controlar e melhorar a performance da sua organização. Ambos
enfrentam o desafio de aumentar a performance de sistemas que são demasiado
complexos para se entender em todos os detalhes e que são, em qualquer situação,
inacessíveis em tempo real. O
golfe oferece, em primeira mão, uma experiência relativamente às dificuldades
de mudança organizacional e demonstra a grande diferença que existe entre boas
ideias e acção eficaz. Em resumo, o jogo oferece aos seus devotos um vislumbre
da subtil relação entre disciplina e liberdade em sistemas complexos. O que
evidencia como fundamentos sólidos, praticados sistematicamente (o que implica
repetição), podem facilitar o movimento solto, livre de restrições, característico
das performance de especialistas em todos os tipos de situações/envolventes
complexas, desde o corpo humano a grupos, a comunidades e a empresas. O golfe
ilustra também um dilema básico – a futilidade da prática sem
“feedback” atempado e específico – que também ocorre na gestão. Dos sistemas e da Estratégia
Como
um sistema complexo, uma organização empresarial opera, claramente, em escala
maior em tempo e em espaço do que um indivíduo “swingando” um “club”
de golfe. Contudo, o pressuposto nuclear em sistemas de pensamento é que as diferenças, em escala, entre tipos de sistemas não
afectam as suas semelhanças fundamentais. O
golfe ensina-nos acerca do pensamento sistémico e, ao fazê-lo, ajuda-nos a
compreender a complexidade da relação causa - efeito e a dificuldade de se
fazer mudanças em sistemas complexos. Não ensina através de leituras e lições
mas através de experiência estruturada. Absorvermos a noção de um sistema
dando atenção aos movimentos dos nossos corpos. Agarramos o significado da
sinergia sentindo a explosão controlada através da bola. O golfe ensina-nos a
trabalhar com persistência e focalizadamente, e lembra-nos que o comportamento
é modificado, principalmente, pela experiência e pelo “feedback”, não
pelo estímulo de boas ideias. O
golfe, jogado seriamente, ensina-nos a pensar estrategicamente. Não podemos
apenas “bater e ter esperança”.
Apenas temos que,
continuamente, pensar para a frente e construir “histórias” com imaginação,
ou “memórias” de futuro, como já foram designadas. Qual é a melhor forma
de jogar este buraco? Qual o melhor caminho para o atingir? De onde planeio
fazer o “putt”? Que género de segundo “shot” devo jogar? Onde fazer o
“tee shot”? Que “swing” fazer? Como deve ele parecer? E como deve ele
fazer-me sentir? No
golfe, tornamos intenções abstractas em acções concretas. O
golfe encoraja-nos a contemplar múltiplos cenários e a considerar os aspectos
desfavoráveis das nossas estratégias. Suponham que a bola não faz “slice”.
Que acontece se faço nova pancada curta, ou a direito? No golfe, as questões
relacionadas com a estratégia do jogo não podem ser separadas das questões
sobre competência e circunstância. O jogo, tal como a gestão eficaz, requer
análise, mas não fica presa a ela. Sabemos que não podemos arriscar indo
muito além da nossa capacidade de execução dos nossos planos.
Quando o fazemos, acontece o desastre. E, no golfe, tal como no management,
somos frequentemente os arquitectos dos nossos próprios infortúnios. Este
desafio não é, sistematicamente, diferente do que se vive ao implementar uma
estratégia numa organização empresarial. Planos formulados no topo das
organizações revelam-se difíceis de seguir precisamente pelas mesmas razões
que no golfe. Operacionais nos níveis inferiores do sistema podem compreender a
linguagem da estratégia, de uma forma abstracta, mas raramente dominam o que têm
que fazer para tornar a estratégia realidade. Efectivamente, a estratégia
formulada nos níveis superiores de um sistema – para se tornar efectiva –
tem de percorrer um longo processo de tradução à medida que todas as pequenas
implicações na acção são descobertas, testadas e aperfeiçoadas em muitos níveis. Outra
particularidade do golfe aplica-se com igual força às empresas: atenção
reduzida e pouco tempo dedicado a conseguir que as coisas sejam feitas,
especialmente seguindo rotinas ineficazes, inadequadas, ou feedback insuficiente. O
“swing” no golfe – uma perspectiva de sistema. Especificamente,
o “golf swing” ilustra três regimes de feedback comuns a todos os
sistemas humanos – controlo estático, controlo dinâmico e movimentos balísticos: Primeiro:
Controlo Estático – Quando
o golfista se dirige à bola e faz o “grip”, a posição e define a
postura, há imenso tempo para dar atenção às observações de um instrutor,
olhar para o espelho, ou utilizar outras fontes de feedback a fim de
conseguir uma posição de partida correcta. Do
mesmo modo, na estrutura organizacional formal de uma empresa podem-se fazer
ajustamentos com uma certa tranquilidade, utilizando o conselho de especialistas
e pode-se comparar o seu posicionamento com o de organizações tidas por
excelentes. O tempo, então, não é um constrangimento sério – o problema
real consiste em manter o foco e a atenção sobre os detalhes. Mesmo
sendo esta fase do “swing” tão crítica, muitos golfistas acham aborrecido
passar muito tempo sobre a forma de fazer o “address” à bola. Em resultado,
facilmente se cai no descuido que é uma das razões por que os amadores têm
uma posição menos consistente do que os profissionais. De igual forma, nesta
época de “grupos de projecto ad hoc, de mudança constante e de pressões
de rapidez, também as organizações empresariais se tornam descuidadas
relativamente à robustez do seu posicionamento estrutural básico. Como
veremos, isto pode ter consequências desastrosas. Segundo:
Controlo Dinâmico –
Embora o backswing no
golfe seja um movimento dinâmico, com muito componentes, ainda há tempo,
durante a sua execução, para alguns mecanismos de feedback. Para o
golfista, os elos
de informação importantes são usualmente internos e baseiam-se nas
sensações dos músculos e das articulações. A evidência revela que os
golfistas aptos podem sentir, no percurso do backswing, onde se encontra
a cabeça do club. Veja-se a surpreendente capacidade de Tiger Woods de
parar o seu backswing no topo do movimento, como se estivesse distraído.
Jack Nicklaus também afirma que quando o seu timing é bom, é capaz de
corrigir os erros que sente durante o backswing. Os backswings de
ambos são construídos com controlo baseado em feedback, em contraste
com os frenéticos e irregulares movimentos de muitos amadores. As
situações de controlo dinâmico encontram-se em todo o mundo empresarial. Tal
como no golfe, as organizações e equipas com elevada performance podem
exercer controlo eficaz baseado em feedback, enquanto
as
empresas menos aptas não podem. Por
exemplo, uma estrutura formal estática não consegue controlar o
desenvolvimento desregrado ou desfocalizado de novos produtos, mas gestores de
projecto habilitados podem fácilmente sentir quando as coisas seguem o caminho
certo e quando não seguem. Os mecanismos de feedback que utilizam são
normalmente intuitivos – uma espécie de moral pessoal (individual), a experiência
das comunicações interpessoais e das relações, etc.... Este feedback
permite-lhes fazer intervenções eficazes em tempo real para manter os
projectos em marcha. As organizações menos competentes não serão (tão) sensíveis
ao feedback. Como resultado, problemas não detectados apodrecem e muitos
projectos podem ficar descontrolados sem que haja tempo de desenvolver esforços
para os resolver ou salvar. Esta
incapacidade de sentir ou de agir em feedback conduz as situações de
controlo dinâmico a caírem no terceiro tipo de feedback – o movimento
balístico! Terceiro:
Movimentos balísticos –
No golfe, o downswing tem de
ser executado sem o benefício de qualquer feedback em tempo real. O
movimento é realizado tão rapidamente, e é implementado por estruturas e
processos tão afastados do cérebro, que não há tempo para as mensagens
percorrerem, em tempo útil, a rede do sistema nervoso. O golfista tem de
confiar em que escolheu a estratégia correcta, de que ensaiou o movimento
correctamente e de que se colocou na posição correcta no topo do backswing
– a partir do qual faz disparar a cabeça do club. Os
movimentos balísticos abundam nas empresas. Qualquer iniciativa empresarial,
desde uma reunião sobre sistemas de informação até ao lançamento de um novo
produto passa – em algum estado do seu percurso – por movimentos com essas
características, não havendo então possibilidade de acções de feedback
em tempo real para correcções de percurso. Mas
a lição a tirar do golfe é que as fases balísticas devem ser tão breves
quanto possível e os movimentos seus componentes cuidadosamente praticados. Demasiados
golfistas precipitam-se em todas as fases do seu swing – o setup,
o backswing e o downswing. Receando perder o seu swing,
transformam, desnecessariamente, todo o procedimento num movimento balístico! As
empresas, particularmente as que têm ambiciosos objectivos de crescimento, são
como os golfistas super ansiosos que fazem investidas precipitadas nos seus swings
. No limite do caos
Sistemas
complexos integram muitos e especializados agentes. Estes interagem de muitas
formas diferentes, em diversas dimensões, não podendo qualquer delas ser
ignorada. Nas organizações empresariais, as pessoas são o melhor e mais óbvio
exemplo de tais agentes. São usualmente agregadas a fim de formarem os órgãos
funcionalmente especializados do corpo empresarial, tais como o marketing,
a contabilidade, o fabrico. Elas podem também ser agrupadas em equipas -
projecto, ou em task forces horizontais. As empresas muito rápidas, que
confiam exclusivamente em equipas horizontais, correm sempre o risco de
enfraquecerem perigosamente as suas aptidões básicas de setup. Este
dilema é familiar a qualquer golfista, na medida que ele percorre a fronteira
irregular que separa a mecânica robusta e a integração de vários componentes
num todo integrado sem emendas. Por um lado, demasiado stress nas partes pode fácilmente
conduzir à ruptura da sua integração. Por outro lado, demasiado ênfase na
integração pode fácilmente conduzir a uma execução deficiente das funções
do indivíduo. A questão não é
as partes ou o todo, mas ambas as coisas: as partes e
o todo. Sistemas
complexos adaptam-se, no “limite do caos”, na fronteira entre as operações
internas e o mundo exterior. Organizações como monopólios e agências
governamentais vivem fora daquele limite mas aprendem pouco. Não têm estímulos.
Os golfistas vivem no limite do caos, não sabendo nunca quando as aptidões de
que dependem podem-nos abandonar, embora frequentemente ultrapassem o limite
testando shots que excedem as suas capacidades. Mesmo os melhores
profissionais são vulneráveis a repentinas e misteriosas perdas de competência. A
estabilidade em sistemas complexos advém de variáveis maiores e mais lentas
comandarem variáveis menores e mais rápidas. A
mudança repentina toma lugar quando os agentes num nível do sistema esquecem
os constrangimentos normalmente exercidos por agentes de outra parte do sistema.
As políticas, os procedimentos, os sistemas e as rotinas que caracterizam
organizações complexas e de grande dimensão evoluíram ao longo de extensos
períodos de tempo. Tipicamente, mudam com pouca frequência, incrementalmente e
só após experimentação e validação consideráveis. Liberdade Sem DisciplinaO controlo de sistemas complexos está muito disperso. Por conseguinte, as relações de causa - efeito são difíceis de identificar, e as respostas para as modificar produzem frequentemente resultados perversos. Tal como as causas de um mau shot no golfe, complicadas teias de causa – efeito existem em muitos níveis: causas que podem ser separadas, no tempo e no espaço, dos seus efeitos, erros que se podem deslocar uns aos outros e movimentos correctos em momentos errados podem ter consequências desastrosas. Como todos os golfistas sabem, uma lição do profissional tem por vezes efeitos contraditórios – piorando a performance antes de (por vezes) a melhorar. A história é muito importante em sistemas complexos estabelecidos. Concepções claras são condição necessária, mas não suficiente para a sua implementação facil. Refazer sistemas de processamento de dados a partir do zero e implementá-los utilizando abordagens big-bang é altamente arriscado – recorde-se o número de muitas organizações tidas por competentes que viveram elevada turbulência implementando sistemas de planeamento de recursos empresariais. Efectivamente, a decisão de fazer conversões big-bang requer que uma grande parte do processo seja completamente balística e assim minimize o risco. Tornar esse tipo de projectos modulares – quebrando-os em segmentos mais pequenos – torna as posições balísticas relativamente curtas assim permitindo o feedback entre elas. É exactamente o que acontece com um golfista que joga um longo par 5 em três shots em vez de arriscar fazê-lo em dois. Sem extensa prática – testando as rotinas de conversão – o desastre é inevitável. Management: Lugar Encantado Como referido, as diferenças em nível e em escala entre o golfe e a gestão não afectam do mesmo modo as semelhanças sistémicas entre as duas actividades. Todavia, são necessários sistemas de pensamento sempre que as organizações ou os golfistas tentam aprender a partir da experiência de especialistas no seu próprio campo. O Golfe é uma busca do “lugar encantado” em tempo e em escala; é uma réplica em miniatura do caminho sistemático no qual podemos exercitar o controlo sobre as trajectórias das nossas próprias vidas bem como das nossas organizações. Efectivamente, o golfe pode ajudar-nos a compreender como utilizar o nosso tempo. Ele ensina-nos a repensar no momento presente, utilizando os objectivos (futuro) e o feedback para aí nos mantermos e tornarmos estes possíveis. Abordar o jogo de golfe ou um desafio de gestão utilizando metas desta forma dá-nos um relance da excitação e da camaradagem que podem existir em sistemas humanos complexos quando utilizamos o futuro como catalisador para alimentar o crescimento, a aprendizagem e a performance no presente.
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