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Este artigo foi publicado em "The Strategist", uma publicação periódica da DPI - Decision Processes International, tendo sido traduzido e adaptado pelo economista René Cordeiro, partner em Portugal da DPI e que é um praticante entusiasta do golfe

 

 

A Gestão

A gestão contém dois aspectos distintos e críticos: os próprios fundamentos da gestão e o livre movimento da gestão. Este ─ determinado pelo drive de cada individuo, pela forma como e pelo momentum em que cada um age ─ dificilmente existe com eficácia sem aquele: o domínio de matérias necessárias ao exercício da gestão. Este domínio releva dois outros aspectos: a (boa) gestão carece de sistematização e de método.

Estes aspectos são fundamentais para que os executivos controlem e melhorem o desempenho da sua organização. Porque o desempenho dos sistemas envolvidos implica o seu controlo para que boas ideias sejam seguidas de acção eficaz. O que evidencia como fundamentos sólidos, praticados sistematicamente ─ o que implica repetição ─ podem facilitar “o movimento solto”, livre de restrições, característico dos desempenhos de especialistas em todos os tipos de situações e de envolventes complexas, desde o corpo humano a grupos, a comunidades, a empresas.

Porque este meu entendimento sobre a prática da gestão tem semelhanças com a prática do golfe, quero partilhar com os meus colegas do Clube de Golfe dos Economistas um artigo de David K. Hurst, publicado há alguns anos na revista que, então, a minha empresa de consultoria em estratégia editava e que traduzi e adaptei. Trata-se, no fundo, do que é que sistemas de pensamento ensinam acerca do Golfe e da Gestão. Espero que os meus Colegas apreciem a ideia.

 

A Gestão e o Golfe

Aprender com o Campo de Golfe

O golfe oferece, em primeira-mão, uma experiência relativamente às dificuldades de mudança organizacional e demonstra a grande diferença que existe entre as boas ideias e a acção eficaz. Em resumo, o jogo oferece aos seus devotos um vislumbre da subtil relação entre disciplina e liberdade em sistemas complexos. O que evidencia como fundamentos sólidos, praticados sistematicamente (o que implica repetição), podem facilitar o movimento solto, livre de restrições, característico da performance de especialistas em todos os tipos de situações envolventes ou envolventes complexas, desde o corpo humano a grupos, a comunidades e a empresas. O golfe ilustra também um dilema básico ─ a futilidade da prática sem feedback atempado e específico ─ que também ocorre na gestão.

Dos Sistemas e da Estratégia

Como um sistema complexo, uma organização empresarial opera, claramente, em escala maior, em tempo e em espaço, do que um indivíduo swingando um club de golfe.

Contudo, o pressuposto nuclear em sistemas de pensamento é que as diferenças, em escala, entre tipos de sistemas não afectam as suas semelhanças fundamentais.

O golfe ensina-nos acerca do pensamento sistémico e, ao fazê-lo, ajuda-nos a compreender a complexidade da relação causa-efeito e a dificuldade de se fazer mudanças em sistemas complexos. Não ensina através de leituras e lições mas através de experiência estruturada. Absorvermos a noção de um sistema dando atenção aos movimentos dos nossos corpos. Agarramos o significado da sinergia sentindo a explosão controlada através da bola. O golfe ensina-nos a trabalhar com persistência e focalizadamente, e lembra-nos que o comportamento é modificado, principalmente, pela experiência e pelo feedback, não pelo estímulo de boas ideias.

O golfe, jogado seriamente, ensina-nos a pensar estrategicamente. Não podemos apenas “bater e ter esperança…”. Apenas temos que, continuamente, pensar para a frente e construir “histórias” com imaginação, ou “memórias” de futuro, como já foram designadas. Qual é a melhor forma de jogar este buraco? Qual o melhor caminho para o atingir? De onde planeio fazer o putt? Que género de segundo shot devo jogar? Onde fazer o tee shot? Que swing fazer? Como deve ele parecer? E como deve ele fazer-me sentir?

No golfe, tornamos intenções abstractas em acções concretas.

O golfe encoraja-nos a contemplar múltiplos cenários e a considerar os aspectos desfavoráveis das nossas estratégias. Suponham que a bola não faz slice. Que acontece se faço nova pancada curta, ou a direito? No golfe, as questões relacionadas com a estratégia do jogo não podem ser separadas das questões sobre competência e circunstância. O jogo, tal como a gestão eficaz, requer análise, mas não fica presa a ela. Sabemos que não podemos arriscar indo muito além da nossa capacidade de execução dos nossos planos. Quando o fazemos, acontece o desastre. E, no golfe, tal como na gestão, somos frequentemente os arquitectos dos nossos próprios infortúnios.

Este desafio não é, sistematicamente, diferente do que se vive ao implementar uma estratégia numa organização empresarial. Planos formulados no topo das organizações revelam-se difíceis de seguir precisamente pelas mesmas razões que no golfe. Operacionais nos níveis inferiores do sistema podem compreender a linguagem da estratégia, de uma forma abstracta, mas raramente dominam o que têm que fazer para tornar a estratégia realidade. Efectivamente, a estratégia formulada nos níveis superiores de um sistema – para se tornar efectiva – tem de percorrer um longo processo de tradução à medida que todas as pequenas implicações na acção são descobertas, testadas e aperfeiçoadas em muitos níveis.

Outra particularidade do golfe aplica-se com igual força às empresas: atenção reduzida e pouco tempo dedicado a conseguir que as coisas sejam feitas, frequentemente seguindo-se rotinas ineficazes, inadequadas e utilizando feedback insuficiente.

O swing no golfe – uma perspectiva de sistema.

Especificamente, o golf swing ilustra três regimes de feedback comuns a todos os sistemas humanos – controlo estático, controlo dinâmico e movimentos balísticos:

Primeiro: Controlo Estático – Quando o golfista se dirige à bola e faz o grip, a posição e define a postura, há imenso tempo para dar atenção às observações de um instrutor, olhar para o espelho, ou utilizar outras fontes de feedback a fim de conseguir uma posição de partida correcta.

Do mesmo modo, na estrutura organizacional formal de uma empresa podem-se fazer ajustamentos com uma certa tranquilidade, utilizando o conselho de especialistas e pode-se comparar o seu posicionamento com o de organizações tidas por excelentes. O tempo, então, não é um constrangimento sério – neste regime, o problema real consiste em manter o foco e dar atenção aos detalhes.

Mesmo sendo esta fase do swing tão crítica, muitos golfistas acham aborrecido passar muito tempo sobre a forma de fazer o address à bola. Em resultado, facilmente se cai no descuido que é uma das razões por que os amadores têm uma posição menos consistente do que os profissionais. De igual forma, nesta época de “grupos de projecto” ad hoc, de mudança constante e de pressões de rapidez, também as organizações empresariais se tornam descuidadas relativamente à robustez do seu posicionamento estrutural básico. Como veremos, isto pode ter consequências desastrosas.

Segundo: Controlo Dinâmico – Embora o backswing no golfe seja um movimento dinâmico, com muitos componentes, ainda há tempo, durante a sua execução, para alguns mecanismos de feedback. Para o golfista, os elos de informação importantes são usualmente internos e baseiam-se nas sensações dos músculos e das articulações. A evidência revela que os golfistas aptos podem sentir, no percurso do backswing, onde se encontra a cabeça do club. Veja-se a surpreendente capacidade de Tiger Woods de parar o seu backswing no topo do movimento, como se estivesse distraído. Jack Nicklaus também afirma que quando o seu timing é bom, é capaz de corrigir os erros que sente durante o backswing. Os backswings de ambos são construídos com controlo baseado em feedback, em contraste com os frenéticos e irregulares movimentos de muitos amadores.

As situações de controlo dinâmico encontram-se em todo o mundo empresarial. Tal como no golfe, as organizações e as equipas com elevado desempenho podem exercer controlo eficaz baseado em feedback, enquanto as empresas menos aptas não podem.

Por exemplo, uma estrutura formal estática não consegue controlar o desenvolvimento desregrado ou desfocalizado de novos produtos, mas gestores de projecto habilitados podem facilmente sentir quando as coisas seguem o caminho certo e quando não seguem. Os mecanismos de feedback que utilizam são normalmente intuitivos – uma espécie de moral pessoal (individual), a experiência das comunicações interpessoais e das relações, etc.... Este feedback permite-lhes fazer intervenções eficazes em tempo real para manter os projectos em marcha. As organizações menos competentes não serão (tão) sensíveis ao feedback. Como resultado, problemas não detectados apodrecem e muitos projectos podem ficar descontrolados sem que haja tempo de desenvolver esforços para os salvar.

Esta incapacidade de sentir ou de agir em feedback conduz as situações de controlo dinâmico a caírem no terceiro tipo de feedback – o movimento balístico!

Terceiro: Movimentos balísticos – No golfe, o downswing tem de ser executado sem o benefício de qualquer feedback em tempo real. O movimento é realizado tão rapidamente, e é implementado por estruturas e processos tão afastados do cérebro, que não há tempo para as mensagens percorrerem, em tempo útil, a rede do sistema nervoso. O golfista tem de confiar em que escolheu a estratégia correcta, de que ensaiou o movimento correctamente e de que se colocou na posição correcta no topo do backswing – a partir do qual faz disparar a cabeça do club.

Os movimentos balísticos abundam nas empresas. Qualquer iniciativa empresarial, desde uma reunião sobre sistemas de informação até ao lançamento de um novo produto passa – em algum estado do seu percurso – por movimentos com essas características, não havendo então possibilidade de acções de feedback em tempo real para correcções de percurso.

Mas a lição a tirar do golfe é que as fases balísticas devem ser tão breves quanto possível e os movimentos seus componentes cuidadosamente praticados.

Demasiados golfistas precipitam-se em todas as fases do seu swing – o setup, o backswing e o downswing. Receando perder o seu swing, transformam, desnecessariamente, todo o procedimento num movimento balístico!

As empresas, particularmente as que têm ambiciosos objectivos de crescimento, são como os golfistas super ansiosos que fazem investidas precipitadas nos seus swings.

No limite do caos

Sistemas complexos integram muitos e especializados agentes. Estes interagem de muitas formas diferentes, em diversas dimensões, não podendo qualquer delas ser ignorada. Nas organizações empresariais, as pessoas são o melhor e mais óbvio exemplo de tais agentes. São usualmente agregadas a fim de formarem os órgãos funcionalmente especializados do corpo empresarial, tais como o marketing, a contabilidade, o fabrico. Elas podem também ser agrupadas em equipas – projecto ou em task forces horizontais. As empresas muito rápidas, que confiam exclusivamente em equipas horizontais, correm sempre o risco de enfraquecerem perigosamente as suas aptidões básicas de setup. Este dilema é familiar a qualquer golfista, na medida que ele percorre a fronteira irregular que separa a mecânica robusta e a integração de vários componentes num todo integrado sem emendas. Por um lado, demasiado stress nas partes pode facilmente conduzir à ruptura da sua integração. Por outro lado, demasiada ênfase na integração pode facilmente conduzir a uma execução deficiente das funções do indivíduo. A questão não é as partes ou o todo, mas ambas as coisas: as partes e o todo.

Sistemas complexos adaptam-se, no “limite do caos”, na fronteira entre as operações internas e o mundo exterior. Organizações como monopólios e agências governamentais vivem fora daquele limite mas aprendem pouco. Não têm estímulos. Os golfistas vivem no limite do caos, não sabendo nunca quando as aptidões de que dependem podem abandoná-los, embora frequentemente ultrapassem o limite testando shots que excedem as suas capacidades. Mesmo os melhores profissionais são vulneráveis a repentinas e misteriosas perdas de competência.

A estabilidade em sistemas complexos advém de variáveis maiores e mais lentas comandarem variáveis menores e mais rápidas.

A mudança repentina toma lugar quando os agentes num nível do sistema esquecem os constrangimentos normalmente exercidos por agentes de outra parte do sistema. As políticas, os procedimentos, os sistemas e as rotinas que caracterizam organizações complexas e de grande dimensão evoluíram ao longo de extensos períodos de tempo. Tipicamente, mudam com pouca frequência, incrementalmente e só após experimentação e validação consideráveis.

Liberdade Sem Disciplina

O controlo de sistemas complexos está muito disperso. Por conseguinte, as relações de causa-efeito são difíceis de identificar, e as respostas para as modificar produzem frequentemente resultados perversos. Tal como as causas de um mau shot no golfe, complicadas teias de causa-efeito existem em muitos níveis: causas que podem ser separadas, no tempo e no espaço, dos seus efeitos, erros que se podem deslocar uns aos outros e movimentos correctos em momentos errados podem ter consequências desastrosas.

Como todos os golfistas sabem, uma lição do profissional tem por vezes efeitos contraditórios – piorando o desempenho antes de (por vezes) o melhorar.

A história é muito importante em sistemas complexos estabelecidos. Concepções claras são condição necessária, mas não suficiente para a sua implementação fácil. Refazer sistemas de processamento de dados a partir do zero e implementá-los utilizando abordagens big-bang é altamente arriscado – recorde-se o número de muitas organizações tidas por competentes que viveram elevada turbulência implementando sistemas de planeamento de recursos empresariais. Efectivamente, a decisão de fazer conversões big-bang requer que uma grande parte do processo seja completamente balística e assim minimize o risco. Tornar esse tipo de projectos modulares – quebrando-os em segmentos mais pequenos – torna as posições balísticas relativamente curtas assim permitindo o feedback entre elas. É exactamente o que acontece com um golfista que joga um longo par 5 em três shots em vez de arriscar fazê-lo em dois.

Sem extensa prática – testando as rotinas de conversão – o desastre é inevitável.

Gestão: Lugar Encantado

Como referido, as diferenças em nível e em escala entre o golfe e a gestão não afectam do mesmo modo as semelhanças sistémicas entre as duas actividades. Todavia, são necessários sistemas de pensamento sempre que as organizações ou os golfistas tentam aprender a partir da experiência de especialistas no seu próprio campo. O Golfe é uma busca do “lugar encantado” em tempo e em escala; é uma réplica em miniatura do caminho sistemático no qual podemos exercitar o controlo sobre as trajectórias das nossas próprias vidas bem como das nossas organizações.

Efectivamente, o golfe pode ajudar-nos a compreender como utilizar o nosso tempo. Ele ensina-nos a repensar no momento presente, utilizando os objectivos (futuro) e o feedback para aí nos mantermos e tornarmos estes possíveis.

Abordar o jogo de golfe ou um desafio de gestão utilizando metas desta forma dá-nos um relance da excitação e da camaradagem que podem existir em sistemas humanos complexos quando utilizamos o futuro como catalisador para alimentar o crescimento, a aprendizagem e o desempenho no presente.

 

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Revised: 01-07-2022 .